Equipe coordenada pelo Google realizou em 200 segundos operação que levaria 10 mil anos em computador clássico, a chamada 'supremacia quântica'; artigo científico que explica avanço foi publicado na revista Nature e é contestado pela rival IBM
Na computação clássica, usada por PCs e smartphones atuais, toda e qualquer informação é armazenada ou processada na forma de bits - que podem ser representados por 0 ou 1. Mas, na quântica, os chamados qubits, ou bits quânticos, podem assumir inúmeros estados entre 0 e 1, num fenômeno chamado superposição. Isso aumenta exponencialmente a quantidade de informação que pode ser processada ao mesmo tempo. Enquanto um par de bits tradicionais expressa um tipo de informação de cada vez, dois bits quânticos podem expressar (ou seja, ter) quatro estados ao mesmo tempo. Estima-se que 300 qubits expressem um número de estados maior do que o número de átomos do universo.
A máquina do Google foi capaz de solucionar, em três minutos e 20 segundos, uma operação matemática que demoraria 10 mil anos para ser solucionada em uma máquina tradicional. Para realizar a tarefa, a companhia construiu um chip, batizado de Sycamore, com 53 qubits. Em março de 2018, a companhia chegou a desenvolver um chip de 72 qubits, mas recuou após enfrentar erros no projeto. Em um computador quântico, não é só a quantidade de qubits que importa, mas sim sua qualidade, pois eles apresentam alta instabilidade. A IBM, concorrente na busca pelo computador quântico, já havia anunciado chips com a mesma capacidade, mas ainda não havia apresentado resultados de sua utilização em operações complexas.
Em setembro, o estudo do Google chegou a ser publicado acidentalmente no site da Nasa e removido logo em seguida, gerando expectativa na comunidade científica. O Estado apurou que houve um erro de procedimento na agência espacial americana. Antes de mandar qualquer trabalho para um publicação científica, pesquisadores da Nasa precisam submeter a pesquisa para aprovação interna. Após o sinal verde, o trabalho fica acessível em um arquivo público. Em casos de pesquisa com divulgação com data marcada, é necessário que isso seja indicado num campo específico da plataforma para evitar a divulgação pública - o que não foi feito, permitindo a circulação antecipada do feito.
A participação da Nasa no vazamento se justifica. Embora o Google tenha encabeçado e financiado integralmente o esforço, a pesquisa reuniu 76 pesquisadores de 10 instituições diferentes. Além do Google Research, braço de pesquisa da companhia, e da Nasa, fazem parte do esforço universidades dos EUA e da Alemanha, incluindo a Universidade de Massachusetts, o Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech) e a Universidade da Califórnia em Santa Barbara.
"É um feito histórico. É um desenvolvimento tecnológico que vem sendo construído ao longo dos últimos 20 anos que emprega técnicas de nanociência e nanofabricação, além de uma técnica de controle incrível", diz Ivan Oliveira, pesquisador do Centro Brasileiro de Pesquisa Física (CBPF), órgão federal vinculado ao Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC).
Para Bárbara Amaral, pesquisadora de informação quântica do Instituto de Física da Universidade de São Paulo, a pesquisa renova o fôlego dos estudos em computação quântica, que convivia com uma sombra de dúvidas sobre sua viabilidade. "O feito traz uma mensagem de esperança para quem é da área. Tem muito tempo que os cientistas estão atrás disso. O que eles fizeram é muito difícil e requer muito investimento" diz.
Máquina tem engenharia complexa
A supremacia quântica foi atingida quando o chip do Google desvendou o funcionamento de um gerador de números aleatórios, dispositivo que gera informações em forma de "zeros" e "uns" que supostamente não podem ser previstas. É como tentar prever os resultados de fazer cara e coroa diversas vezes. É uma ferramenta muito usada por games, por exemplo.
Tentar decifrar esse gerador demoraria 10 mil anos para ser feito pelo mais potente computador tradicional do mundo, o Summit, da IBM. O resultado é a conclusão de um trabalho de cinco anos da divisão de computação quântica do Google.
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