segunda-feira, 25 de fevereiro de 2019

O Supremo pode manter o veto à redução de salários e jornadas de trabalho dos servidores estaduais

Governadores vão enfrentar dificuldades para obter aval do STF (Supremo Tribunal Federal) à redução dos salários e da jornada de trabalho de servidores estaduais, avalia a equipe do governo federal que acompanha a situação de calamidade financeira nos Estados. A medida deve ser debatida nesta quarta-feira, quando a Corte discutirá ações que contestam dispositivos da LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal).
O julgamento é considerado uma das principais apostas para Estados darem fôlego às contas públicas neste momento em que sete deles já decretaram calamidade financeira por não conseguirem pagar funcionários e fornecedores. Assim que foram eleitos, os novos governadores fizeram pressão para que a Corte voltasse ao tema e desse autorização para que eles recorressem à medida polêmica, com forte resistência de sindicatos que representam o funcionalismo.
Em 2002, por unanimidade, o Supremo suspendeu trechos da lei que permitiam a redução de salário e de jornada de trabalho de servidores. A medida, emergencial, poderia ser acionada quando o gasto com pessoal ultrapassasse o limite de 60% da receita líquida – realidade de 14 Estados em 2017, de acordo com dados oficiais do Tesouro Nacional.
Nos bastidores, a expectativa é a de que a pressão dos Estados e a crise fiscal podem levar pelo menos três ministros a se posicionarem a favor da volta da possibilidade de cortar os salários com consequente redução da jornada: Gilmar Mendes, Alexandre de Moraes (relator das ações) e Dias Toffoli (presidente do STF), que tem discurso afinado ao da equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes.
Quando o Supremo julgou o caso em 2002, Moraes e Toffoli ainda não integravam o Tribunal. E Gilmar já estava na Casa, mas poderá ficar de fora da votação, pelo fato de já ter se manifestado no processo da LRF, na condição de advogado-geral da União.
Na avaliação de um ministro ouvido reservadamente pela reportagem, é questionável falar que os salários são irredutíveis se não há recursos para pagá-los. Esse magistrado destaca que os bombeiros que atuaram para socorrer a população de Brumadinho depois da tragédia com o rompimento de uma barragem trabalharam sem receber o décimo terceiro – e com salários parcelados.
Já um outro integrante da Corte, por sua vez, enxerga na discussão do tema um cenário de ameaça à estabilidade de servidores e de deterioração das condições de trabalho do funcionalismo público.
Veto
Mesmo com a penúria das finanças dos Estados, especialistas ouvidos pela reportagem acreditam que o STF deve manter o veto à possibilidade de redução de salários de servidores.
“Ainda que a situação econômica seja outra, é uma questão muito técnica e clara. Precisaria de um malabarismo muito grande e criativo, porque é notório que esses dispositivos extrapolam o texto da Constituição”, diz Tathiane Piscitelli, professora de direito tributário e finanças públicas da FGV Direito São Paulo.
Para o advogado trabalhista José Alberto Couto Maciel, a redução dos salários e da jornada de trabalho é “evidentemente inconstitucional”. “Não vejo como o STF vai entender que não se pode violar a Constituição para se obter isso.”
Apesar de polêmica por mexer nas regras do funcionalismo, o tema virou bandeira para o governador do Rio, Wilson Witzel (PSC), que assume publicamente a necessidade de se ampliar a margem permitida ao administrador. Antes dele, Paulo Hartung (MDB), que deixou o governo do Espírito Santo, já havia iniciado um movimento a favor da ação.
No fim do ano passado, governadores eleitos fizeram uma romaria a Vitória para pegar conselhos com Hartung, único a receber nota A por sua capacidade de pagamento pela Secretaria do Tesouro Nacional. Ele já se manifestou em defesa da medida como forma de ajudar a equilibrar as contas em tempos de crise: “O setor privado tem seus instrumentos, o setor público também precisa ter”.
Na avaliação de José Matias-Pereira, professor de administração pública da UnB (Universidade de Brasília), a LRF não foi capaz de evitar a atual crise, mesmo sendo uma espécie de código de conduta dos gestores: “A lei tentou conter essa ânsia perdulária dos Estados, mas com a má gestão pública, o patrimonialismo e o corporativismo, os Estados chegaram a essa situação. A LRF sozinha não resolve o problema fiscal do País”.
O PT é autor de uma das ações que contestam no STF a possibilidade de governos cortarem salários e reduzirem a jornada de trabalho de servidores. A OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), o PCdoB, o governo de Minas Gerais e a Conamp (Associação Nacional dos Membros do Ministério Público) também acionaram o Supremo para contestar trechos da LRF e terão suas ações julgadas a partir desta quarta-feira.

Nenhum comentário:

Postar um comentário