A movimentação de congressistas e ministros do STF (Supremo Tribunal
Federal) para elaborar um projeto de lei que limite os poderes de
fiscalização da Receita Federal provocou indignação entre os fiscais do
órgão, que prometem uma grande mobilização para barrar o avanço da
articulação.
O Sindifisco (Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais) buscará apoio
da sociedade e do Ministério Público para impedir que algum projeto
desse tipo seja aprovado. A ofensiva contra o modelo de atuação do Fisco
está sendo chamada na Receita de “projeto mordaça”. O texto do novo
projeto de lei em discussão pretende deixar mais claros os limites de
atuação da Receita. A crítica é que os auditores têm avançado no campo
criminal em vez de focar em possíveis irregularidades tributárias.
Segundo mostrou reportagem do jornal “O Estado de S. Paulo” publicada
no domingo, o vazamento de dados sobre uma investigação tributária
envolvendo o ministro Gilmar Mendes, do STF, gerou um movimento para
mudar a legislação sobre a Receita de forma a limitar seus poderes.
Durante almoço na semana passada, ministros da Corte reprovaram a
atuação da Receita, que elaborou relatório apontando possíveis atos de
“corrupção, lavagem de dinheiro, ocultação de patrimônio ou tráfico de
influência por parte do ministro Gilmar Mendes e familiares”. Dos 11
ministros, sete estavam no encontro.
O projeto de lei para impor limites à atuação do Fisco vem sendo
discutido em conversas reservadas de ministros com parlamentares. Se
concretizada, a mudança poderá causar impacto no modo como o Fisco tem
cooperado com grandes investigações de combate à corrupção e lavagem de
dinheiro, a exemplo da Operação Lava-Jato.
A boa interlocução de integrantes da Corte com o presidente da
Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), é considerada um dos trunfos para fazer a
ideia prosperar. Para o presidente do Sindifisco, Kléber Cabral, a
articulação é preocupante. “É curiosa a tentativa, porque a lei autoriza
o que a Receita faz”, afirmou. “Se houvesse alguma questão de
descumprimento da lei, o Judiciário teria se manifestado.”
O secretário da Receita, Marcos Cintra, está sendo cobrado pelos
sindicalistas a fazer uma declaração contundente de apoio ao trabalho de
investigação do órgão, o que não aconteceu até agora. Cintra tem atuado
para diminuir a temperatura da crise, que ameaça ganhar proporções
maiores se o projeto for apresentado no Congresso.
Para Mauro Silva, diretor da Unafisco (Associação Nacional dos
Auditores Fiscais), o movimento, que partiu do Judiciário, fere o
princípio de equilíbrio entre os Poderes. “Os poderosos não são as
únicas forças políticas”, afirmou ele, que aposta numa mobilização para
garantir o trabalho de fiscalização da Receita.
STF
O descontentamento ficou claro em discurso do presidente do Supremo,
ministro Dias Toffoli, em evento de posse da diretoria do Sindifisco, na
quarta-feira (20). Em seu discurso, Toffoli disse ser necessário
“delimitar” o modo como age a Receita. “Qual seria o nível de
detalhamento dessas explorações bancárias e fiscais cometidas pelo Fisco
no seu exercício legítimo de fiscalizar?”, questionou o presidente do
Supremo. “É extremamente relevante delimitarmos para dar mais segurança
para a atuação do Fisco e dos auditores da Receita.”
O presidente do Supremo afirmou ainda que já votou em alguns casos a
favor da possibilidade de o Fisco ter acesso ao sigilo bancário dos
contribuintes sem autorização da Justiça. No entanto, os auditores
presentes entenderam a afirmação como um recado de Toffoli de que poderá
mudar de postura.
No mesmo evento estava o secretário especial da Receita, Marcos
Cintra. Quando questionado se o Fisco deve subsidiar grandes operações,
ele afirmou que a atuação deve ser somente “se o órgão competente
requisitar informações”.
O ponto central da tensão com ministros do STF e políticos é o modelo
de atuação, especialmente em casos envolvendo agentes públicos,
empregado pelo Fisco nos últimos anos. O modelo segue os padrões das
autoridades tributárias de países desenvolvidos. Antes reativa, pois só
atuava por solicitação de outros órgãos fiscalizadores, a Receita passou
a se valer do aprendizado obtido na cooperação com grandes
investigações de combate à corrupção e lavagem de dinheiro. Passou a
atuar de maneira proativa.
No entendimento de Gilmar Mendes e dos parlamentares que defendem uma
mudança na atuação do Fisco, esse tipo de trabalho inverte a lógica da
Receita. Ao mirar primeiro os possíveis crimes, o Fisco estaria deixando
a questão tributária em segundo plano. O atual modelo era defendido
pela antiga cúpula da Receita, mas foi criticado por Cintra, escolhido
por Guedes.
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