segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019

A Igreja Católica enfrenta uma nova crise com as denúncias de casos de freiras abusadas

A Igreja Católica, abalada pelos sucessivos escândalos de pedofilia dos últimos anos, enfrenta uma nova – e talvez mais profunda – crise: os casos das freiras abusadas dentro de congregações. Esta semana, dentro dos muros sagrados, começa uma discussão fundamental para o futuro da igreja. E também para o presente. Como acabar com a pedofilia do clero?
O silêncio de décadas, ou séculos, foi rompido no ano 2000, quando o papa João Paulo II decretou tolerância zero. Os abusos continuaram a ser denunciados, principalmente sobre proteção e o silêncio de bispos.
O papa Bento XVI passou a selecionar com mais rigor a entrada dos jovens padres à igreja e afastou muitos religiosos.
O papa Francisco foi o primeiro pontífice a ver a questão como abuso de poder. No começo de fevereiro, ele admitiu outra grave acusação: os abusos sexuais contra freiras. O papa voltava dos Emirados Árabes e, no avião, ao responder a pergunta de um jornalista, declarou: “É verdade que dentro da igreja há clérigos que fizeram isso. Eu acho que ainda fazem. A Santa Sé está trabalhando faz tempo pra combater esse problema e há toda a vontade de continuar esta luta”.
Em um dos casos, as mulheres foram mantidas como escravas sexuais, o que forçou o antecessor, Bento XVI, a dissolver toda uma congregação.
Rocío Figueroa e Doris Wagner-Resinger são duas religiosas vítimas de abusos cometidos por membros eclesiásticos. Ambas agradeceram o fato de o papa ter reconhecido os escândalos sexuais, observando que, por muito tempo, houve uma “cultura de silêncio e segredo dentro da hierarquia” da Igreja.
“Guia espiritual”
A teóloga Rocío Figueroa é professora em Auckland, na Nova Zelândia, e foi abusada por um padre em Lima, no Peru. Figueroa diz que se juntou à sociedade de vida apostólica dentro da Igreja Católica quando era adolescente porque vivia em uma “parte muito pobre do mundo” e sentia “que precisava fazer algo”.
“Eu tinha 15 anos quando o fundador me pediu para buscar orientação espiritual com um religioso, que se tornou meu guia espiritual.”
Segundo ela, depois de alguns meses, o padre pediu que levasse roupa esportiva para praticar ioga. “Após algumas sessões em grupo, começaram as sessões individuais, e ele me disse que me ensinaria exercícios para desenvolver autocontrole sobre minha sexualidade.”
“Eu era muito inocente, não tinha experiência sexual anterior. Ele começou a me tocar em todos os lugares. Pensei – erroneamente – que ele era bom e eu era ruim.” A vítima pensou que a culpa era dela. “Me senti muito culpada e desorientada.”
“Ele nunca me violou, mas definitivamente cometeu abuso sexual, na minha opinião. A primeira vez que me dei conta de que era vítima de abuso sexual eu tinha 40 anos.”
Figueroa conta que decidiu falar depois que o homem que abusou dela morreu. Ela diz que sentiu que era importante denunciá-lo porque, naquele momento, ele ainda era considerado um homem muito bom pelas pessoas da congregação.
“Antes de abusarem sexualmente de mim, abusavam de mim espiritualmente: não permitiam que eu lesse livros ou conversasse com ninguém sobre assuntos pessoais”, contou Doris Wagner Reisinger, que pertencia a uma congregação na Alemanha.
“Perdi a confiança em mim mesma e me tornei muito frágil. Depois de cinco anos nessa situação, (um membro da comunidade religiosa) começou a se aproximar de mim quando eu estava sozinha. Ele ia ao meu quarto, parava do meu lado e conversava comigo. Um dia ele começou a me abraçar e, em determinado momento, foi ao meu quarto à noite, me despiu e me estuprou. Foi um choque. Eu entendi o que estava acontecendo, mas não podia acreditar. Sabia que não estava certo. Definitivamente eu não queria que acontecesse. Mas estava totalmente convencida: ele é um padre, esta é uma comunidade sagrada, isso é impossível. Tive uma crise de fé séria: meu primeiro impulso foi pensar que, se eu falasse, prejudicaria a Igreja, então Deus queria que eu ficasse quieta. Era inaceitável.”
Doris Wagner-Resinger abandonou a congregação e deixou a vida religiosa em 2011.

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