A Igreja Católica destruiu
arquivos sobre os autores de abusos sexuais, reconheceu neste sábado
(23) o cardeal alemão Reinhard Marx, durante uma reunião histórica no
Vaticano sobre a luta contra a pedofilia.
A cúpula, iniciada na quinta-feira (21), será concluída neste domingo (24) com um discurso do papa Francisco. Segundo
Reinhard Marx, que é presidente da Conferência Episcopal Alemã os
arquivos sobre abusos sexuais, foram destruídos ou nem sequer “chegaram a
ser criados”.
Se existissem, ele poderiam ter
documentado os atos cometidos na igreja e indicar o nome dos
responsáveis. “Os procedimentos e trâmites fixados para perseguir estes
delitos foram deliberadamente ignorados, e inclusive apagados ou
cancelados”, insistiu.
A pedofilia contra crianças e
jovens se deve, em grande parte, ao “abuso de poder da administração”,
apontou o cardeal alemão em seu discurso. Ele lamentou que ao invés de punir os culpados, “as vítimas foram as repreendidas, silenciadas e seus direitos pisoteados.”
O religioso alemão é conhecido por suas posições progressistas. Ele
pediu mais transparência sobre os julgamentos realizados pela igreja
católica e exigiu a divulgação do número de casos examinados pelos
tribunais eclesiásticos, assim como detalhes sobre os mesmos.
Nesta sexta-feira (22), durante
uma reunião histórica sobre pedofilia no Vaticano, vítimas se
emocionaram, mas consideraram insuficientes as medidas propostas pelo
papa Francisco para erradicar o abuso.
A cúpula, que reúne 114 presidentes de conferências episcopais de todo o mundo termina neste domingo com um discurso do Papa. Não
há previsão de adoção de um documento final, embora no curso das
sessões de trabalho seja possível que se estabeleçam algumas medidas
específicas.
Hipocrisia
Uma freira disse neste sábado a bispos que reconhece a
hipocrisia da Igreja Católica na forma como a instituição lidou com
casos de abuso sexual, e um cardeal admitiu que documentos foram
destruídos.
A irmã Veronica Openibo, uma nigeriana que trabalhava
na África, Europa e Estados Unidos, apresentou com uma voz macia uma
importante mensagem aos prelados que estavam diante dela: “A tempestade
não vai passar”.
Ela deu a declaração no início do penúltimo dia de um
encontro no Vaticano com cerca de 200 autoridades da Igreja, convocadas
pelo papa Francisco para confrontar o que ele chamou de castigo devido a
abusos sexuais no clero.
“Proclamamos os Dez Mandamentos e nos consideramos
guardiões dos padrões e valores morais, e do bom comportamento da
sociedade. Hipócritas às vezes? Sim! Por que mantivemos isso oculto por
tanto tempo?”, perguntou.
Ela disse ao papa, que estava sentado ao seu lado no
estrado, que ele era “humilde o suficiente para mudar de ideia”, pedir
desculpas e tomar atitudes depois de ter inicialmente defendido um bispo
chileno acusado de acobertar um abuso. O bispo acabou renunciando.
“Como o clero pôde se manter em silêncio, acobertando
todas essas atrocidades? O silêncio, carregando os segredos nos
corações dos perpetradores, a duração desses abusos e as constantes
transferências de perpetradores foram inimagináveis”, disse.
Ela contou sobre seu choque quando assistiu ao filme
vencedor do Oscar “Spotlight”, de 2015, que contou como líderes da
Igreja em Boston transferiram padres de paróquia em paróquia em vez de
exonerá-los e entregá-los às autoridades.
“No momento, estamos em estado de crise e vergonha.
Obscurecemos seriamente a graça da missão de Cristo”, disse Openibo.
“Temos de reconhecer que nossa mediocridade, hipocrisia e complacência
nos trouxeram a este lugar desgraçado e escandaloso onde nos encontramos
como Igreja. Paramos para rezar: Deus, tenha piedade de nós”, disse.
Ela afirmou que a Igreja tem que acabar com o hábito
de acobertar eventos com medo da repercussão. “Muito frequentemente a
gente mantém fatos sob silêncio até que a tempestade passe. A tempestade
não vai passar. Nossa credibilidade está em jogo”, acrescentou, dizendo
que a hierarquia masculina da Igreja deveria deixar que mais mulheres
se envolvessem na luta contra os abusos.
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